Sódio - Qual o papel para a performance?

Para a maioria dos triatletas, as necessidades reais devem ser específicas para o momento e duração da prova

Sódio - Qual o papel para a performance?

A hidratação é um dos temas mais discutidos dentro da nutrição no triathlon, especialmente entre atletas que competem em distâncias longas ou em ambientes quentes. Contudo, o papel do sódio muitas vezes apresentado como “a solução” para cãibras, fadiga e problemas de hidratação continua envolto em mitos e simplificações.

O primeiro ponto importante é que o sódio não deve ser visto de forma isolada. O seu papel torna-se relevante sobretudo porque influencia a relação entre água e eletrólitos no organismo. É esta relação que determina a osmolaridade plasmática, a sensação de sede, a retenção de líquidos e a regulação do volume extracelular, todos fatores cruciais para o desempenho em provas longas. Assim, mais do que “repor o que se perde no suor”, o objetivo é equilibrar o sódio e água para manter o corpo funcionando de forma estável ao longo do exercício.

No período pré-exercício, muitos atletas acreditam que aumentar a ingestão de sódio vários dias antes da prova pode prevenir a desidratação ou melhorar a performance. A evidência mostra o contrário, o organismo excreta rapidamente o excesso de sódio ingerido, de modo que estratégias prolongadas de “carga de sal” são ineficazes. O que pode funcionar é a ingestão estratégica de sódio nas 3 a 4 horas antes do esforço, especialmente quando se pretende maximizar a hidratação antes de treinos ou competições longas e em casos de atletas mais propícios a desidratação.

Durante o exercício, é onde surgem as maiores dúvidas. Em treinos ou provas com menos de 4 horas, como triathlons Sprint ou Olímpicos, não existe necessidade de uma reposição rigorosa de sódio. A ingestão deve basear-se sobretudo na palatabilidade das bebidas, ajudando o atleta a manter uma hidratação adequada sem cair no erro de tentar “igualar” as perdas de suor. Doses comuns de 300 a 600 mg de sódio por litro tendem a ser suficientes para melhorar o sabor e incentivar a ingestão. Em contrapartida, tentar repor 100% do sódio perdido pode ser contraproducente e até perigoso, aumentando o risco de hipernatremia.

Nas provas mais longas, como o 70.3 ou o Ironman, a situação muda. Aqui, o equilíbrio entre a quantidade de água ingerida e o teor de sódio consumido torna-se mais importante, especialmente quando o atleta consegue ou precisa de repor 70 a 95% dos líquidos perdidos.

Se ingerir grandes volumes de água sem sódio suficiente, o triatleta pode ver a sua concentração plasmática de sódio diminuir, aumentando o risco de hiponatremia, uma condição potencialmente grave. Uma revisão de 2025 indica que atletas com suor “normal” (40 a 60 mmol/L) podem beneficiar de doses entre 300 e 800 mg de sódio por hora, enquanto aqueles com suor muito salgado poderão necessitar de 600 a 1200 mg por hora.

Estas quantidades não são pensadas para repor todas as perdas, mas sim para estabilizar a concentração de sódio quando a ingestão de água é elevada, evitando o risco de hiponatremia.

É importante referir que o sódio não melhora diretamente a performance. Não é um ergogênico no sentido clássico, como a cafeína ou os carboidratos. O seu papel é indireto: ao ajudar a manter uma hidratação mais adequada, permite que o atleta preserve mais facilmente a função cardiovascular e a termorregulação, prolongando a capacidade de manter a intensidade desejada.

Da mesma forma, a relação entre sódio e cãibras é frequentemente exagerada. As cãibras têm causas multifatoriais e o sódio, embora possa desempenhar um papel em situações específicas, está longe de ser a solução universal que muitas vezes se apregoa.

No período pós-exercício, a reposição de sódio só é realmente relevante quando o atleta depende exclusivamente de bebidas de baixa densidade energética para reidratar. Quando alimentos sólidos são consumidos, a quantidade de sódio presente na alimentação é geralmente suficiente para restaurar o equilíbrio. Além disso, o corpo reduz naturalmente a excreção de sódio após grandes perdas, facilitando a recuperação sem necessidade de estratégias agressivas de suplementação.

A conclusão é clara, o sódio deve ser integrado numa estratégia global de hidratação, não tratado como um elemento isolado. A sua utilidade depende da duração da prova, das condições ambientais, da taxa de sudorese e da quantidade de líquido ingerido. Para a maioria dos triatletas, as necessidades reais são mais baixas do que o marketing muitas vezes sugere. Para atletas de longa distância, o sódio torna-se uma ferramenta útil - não para repor tudo o que se perde, mas para manter o equilíbrio certo entre sódio e água, promovendo estabilidade fisiológica e reduzindo riscos.

João Cabral @joaocabral_nutrition
Nutricionista 6356N